Entre Páginas e Carris...
ROMI
O telemóvel é o parente pobre da minha mala de mão. Não pode faltar um livro, um bloco de notas, uma esferográfica, lenços de papel e uns rebuçados estrategicamente espalhados, para que não demore uma eternidade a encontrá-los. Tabaco e isqueiro já não fazem parte do pacote, pelo menos por enquanto, desde há oito meses. Digo isto porque, enquanto a maioria dos passageiros do comboio se agarra ao telemóvel, eu vou a ler. Hábito antigo. Sou do tempo em que o comboio da linha de Sintra demorava horrores a chegar a Lisboa. Só o túnel a seguir a Campolide eram uns bons dez, doze minutos. Um único livro não chegava para a semana toda. Foi aí que desenvolvi uma estratégia: comecei a comprar livros pelo número de páginas. Quantas mais, melhor. E, de preferência, com letra miúda, para render. Foi a minha sorte. Comprei imensos livros de autores que desconhecia, títulos que não me diziam nada. O único critério era o tamanho — dos livros, entenda-se. Descobri histórias incríveis, li obras fantásticas. Hoje não faço essa viagem diariamente. Ainda procuro pechinchas, alfarrabistas e afins, mas já não me pesa no orçamento comprar o livro que me apetece. No entanto, ficou-me o hábito de, de vez em quando, levar para casa um livro às cegas, seguindo os critérios antigos. E ainda me surpreendo. Às vezes pergunto-me como será a vida de quem não gosta de ler. Como preenchem essa lacuna? Para mim, é um dos poucos privilégios que realmente me orgulho de ter.