O DESCONHECIDO DA MEIA NOITE ...
ROMI
Há uns anos, nesta altura e provavelmente a esta hora, amassavam-se filhoses. Era sempre um momento de grande ansiedade, mas feliz. A minha madrasta enervava-se com a azáfama e ralhava muito, a Maria acalmava os ânimos e fazia-me um bonequinho nu, com a massa das filhoses. Trocavam olhares cúmplices entre elas, e eu fazia que entendia aquela cumplicidade, mas não entendia nada. Invariavelmente a massa ficava mal passada, exceto naquela parte minúscula que motivava as gargalhadinhas nervosas. Era permitido ir um bocadinho mais tarde para a cama. Depois vinha a noite mágica, a do bacalhau com batatas e sapatinhos na chaminé. Tentava manter-me acordada, no desejo de surpreender o pai natal a pôr os presentes no sapatinho, mas o sono vencia sempre. Hoje não há filhoses, nem raspanetes, nem sapatos na chaminé. Nem desejo de os ter. A magia dissipou-se e não consigo que se instale. O que me faz realmente falta, é aquela ilusão de que, depois da meia-noite, há um desconhecido que vem de muito longe depositar brinquedos no meu sapatinho, com o objetivo de me fazer feliz...